
Preciso arrumar essa bagunça
Minha vida poderia ser taxada como um disco arranhado.
Olhando pela janela e observando o cenário chuvoso que abraçou minha cidade, percebo que essa aura nublada e meio triste, também abraçou a minha vida. Eu poderia dizer que passou um furacão por aqui. Tudo está fora do lugar: as gavetas estão no chão, o sofá foi arrastado, os livros caíram da estante e eu não sei onde estão meus sapatos. Sentada no chão, ouço o barulho que o vento faz ao bater nas janelas. Quieta, escuto minha mente gritar, agitada. Eu não sei o que aconteceu. Talvez tenha sido o furacão, ou talvez tudo estivesse bagunçado muito antes disso, e eu só percebi agora. Talvez eu estivesse distraída demais com outras coisas, e nem me dera conta dos sinais de alerta. Isso acontece sempre. Nós nos apaixonamos por alguma coisa reluzente e nos perdemos no meio disso.
Você reconhece essa história? Sei que sim.
Percebi que há muito tempo eu não escutava música. Pelo menos, não para escutar a letra. A música sempre me invadia de modo a me fazer evitar pensar. Isso indica que eu estava tentando não observar as coisas que se estavam se acumulando pelos corredores da minha casa. Talvez eu tenha deixado as coisas para depois, talvez eu tenha enrolado com as demandas, talvez eu tenha ficado preguiçosa. Eu não sei ao certo. Olhando as coisas no chão, percebo que preciso arrumar essa bagunça. Nada disso faz sentido para mim. Há velas coloridas perto da porta que eu usava para meditar. Um copo com sal grosso e carvão para afastar más energias perto da janela, e na parede tem um chapéu de praia roxo e todo mundo sabe que odeio praia. E veja só, não é só o externo que está uma bagunça.
Eu estou sangrando por dentro, amor. Dentro de mim, está tudo fora do lugar.
Agora, deitada no chão da sala, sinto que a dor está chegando em ondas, não de uma vez. Ela vai chegar aos poucos, como uma dor de cabeça, que se anuncia aos poucos, até irromper sem volta e te levar para a cama. Eu sabia que a sua ausência me causaria náuseas, mas essa bagunça está me causando mais ainda. No entanto, perdida por entre a bagunça, a poeira e as caixas, continuo aqui. Não estou tão mal quanto eu poderia estar e nem tanto quanto deveria, mas sei que a ainda há mais por vir. Da última vez que tive que arrumar a casa, demorei anos para voltar a receber visitantes e isso acabou comigo. Sei que você sabe disso.
Talvez dessa vez seja diferente. Talvez seja melhor, ou pior — quem poderá dizer?
Agora, eu só sei que preciso me levantar, colocar uma música, prender os cabelos e começar a limpar. Não por você, mas por mim — eu preciso ser encontrada, perdida por entre a bagunça. Ainda em náuseas, empoeirada e em dores de parto desse fim que continua sangrando.
Mas vai parar. Vou renascer. As coisas vão voltar para o lugar. Elas sempre voltam.
Mariana Ravelli
Sempre tem alguém pra me dizer que estou falando muito alto ou que não preciso ser tão incisiva, mas a verdade é que o tempo passa e eu continuo ficando mais ácida e as pessoas mais chatas. Não gosto de barulho, não gosto de gente. Gosto de chás e cachorros fofinhos. Não toque no meu cabelo.

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