
Amor rima com dor
Quem diria que depois de tantos esses anos e inúmeras frases trocadas em versos, ao longo desse romance que se desenrolou através das linhas, a palavra amor acabaria rimando com dor.
Não era o que eu esperava para nós.
Não era o desfecho que eu desejava para essa crônica. Autor algum que se preze quer ver sua história desmoronando enquanto não sabe o que fazer. Um drama é bom até a terceira estrofe, na quarta em diante nós precisamos que o romance volte aos bons ventos e eu possa descansar nos teus braços. Nós éramos o tipo de poesia romântica que todo mundo amava, e confesso amor, aprendi a gostar de nós dois muito mais fácil do que pensei que seria. Nossa história não me causou tremores, descompensação cardíaca ou noites acordadas pela madrugada no começo – embora você tivesse me levado ao extremo da raiva e nós tivéssemos discutido várias vezes por entre as vírgulas, até que o ápice de fato chegasse. Foi tranquilo no começo, mas tem me tirado o sono agora que degringolou.
Quem diria, e nem fui eu que meti os pés pelas mãos.
Não fui eu quem errou, ou quem se cansou ou ficou irritada. Não fui eu quem saiu e beijou outra boca. Antes de chegarmos a terceira estrofe, você pediu uma pausa – o que é uma forma educada de dizer que você resolveu encerrar antes da hora. Sem mais versos ou retóricas, eu estagnei. Não havia mais sobre o que escrever ou porque escrever, restava apenas o amor… que agora, como eu sempre vira em tantos poemas e livros, rimava com a dor. E eu poderia escrever sobre a dor, há muito eu escrevia sobre ela, e sobre todos os outros que vieram e também partiram, e me forçaram a escrever uma quarta estrofe sobre reconciliações intensas e recheadas de beijos sôfregos. Mas eu sou uma boa escritora amor, e uma boa mentirosa também.
Transformar a dor no amor é o que eu faço de melhor, mas não tenho conseguido fazer isso agora. Sua ausência alagou tudo por aqui, e tem matado cada molécula de sanidade ou vontade de escrever e buscar a poesia nesses dias cinzas. Tenho tentado não me sentir tão mórbida, afinal, isso nunca combinou comigo. Mas é o que nos resta a esta terceira estrofe: a confirmação de que o nosso fim é o que é: o fim.
Sem dor. Ou sem amor. Até mesmo sem rancor.
Encarar nós dois, nessa verdade nua crua e assumir, que mesmo depois de tudo, e talvez por conta de tudo, eu não consiga te odiar mesmo que você tenha estragado o texto. Eu não consigo assumir que essa história deveria ter se encerrado naquele momento que você colocou o ponto final, mas eu insisti em um ponto e vírgula. Mania de escritor. A gente sempre acha que dá pra extrair um pouco mais de sumo quando a inspiração vem, e amor, nós éramos incríveis. Mas não mais. Agora só resta o cinza, e a rima que ecoa na minha mente: o amor rima com dor.
Quem diria.
Eu jamais teria previsto isso. Ao adentrar aquela sala e olhar em volta, e te ver sentado naquela cadeira, eu sabia que nos envolveríamos. Amor, eu tinha certeza que eu acabaria com a sua vida e com sua sanidade, mas não que você acabaria com a minha poesia. Isso não era justo. De tudo que você poderia ter me roubado, isto foi o que mais me doeu. E não foi nem de longe o que eu mais amei. Você eu amei mais.
Anna Montez
Uma flor de muitas pétalas, que adora o silêncio e a possibilidade de se redescobrir através das palavras. Publicitária, comunicadora nata e aspirante a socióloga de bar. Adora uma causa perdida, um drama shakespeariano e beijo sedento no final da frase. Sou viciada em histórias. Me conte a sua.

Nós deveríamos tentar

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